Questão Escravista
- A crise final da escravidão
A partir de 1870, com o fim da Guerra do Paraguai, antigos problemas e contradições que não haviam sido resolvidos voltaram à tona com toda a intensidade. Ao mesmo tempo, a incapacidade do Império em resolvê-los tornava se cada dia mais patente.
A questão central era naturalmente o escravismo. Em 1870, fazia vinte anos que o tráfico havia sido extinto, mas a escravidão resistia. Desde o início do século XIX, a GrãBretanha vinha pressionando o Brasil, e a opinião pública contra a escravidão havia crescido no mundo inteiro. Os escravistas brasileiros e o governo, que afinal os representava, haviam adotado a tática do silêncio para proteger os seus interesses. O problema da escravidão, em suma, não era discutido publicamente em parte alguma do Brasil. Muito menos no Parlamento. E isso era coerente, pois os próprios senhores de escravos sabiam que sua posição era insustentável. Porém, não moviam uma palha Pará encaminhar a solução. Fizeram de conta que o problema simplesmente inexistia.
Havia uma explicação para isso. O governo imperial, em seu profundo conservadorismo, inquietava-se com a possibilidade de agitação incontrolável caso a questão escravista fosse abertamente colocada.
Com certeza, essa política do avestruz adotada pelo governo era confortável para os escravistas, mas o inconveniente da situação estava no fato de que o Brasil como um todo não ficou parado. Na verdade, desde a extinção do tráfico em 1850, muitas coisas foram mudando no Brasil. Em seu imobilismo, o governo preferiu ignorar as transformações.
Por volta de 1860 a questão escravista já havia sido colocada publicamente, o que fora uma grande novidade. A eclosão da Guerra do Paraguai interrompeu os debates que estavam começando a ganhar espaço no próprio Parlamento. Eles retornaram com intensidade imediatamente depois da vitória brasileira em 1870.
O panorama em 1870, em síntese, era o seguinte: 62% dos escravos do Brasil estavam concentrados em São Paulo, Minas, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Dos 1 540 000 escravos, 955 109 encontravam-se nessas províncias. No norte e nordeste, em razão de sua decadência econômica, o peso da escravidão havia diminuído. Portanto, os escravistas estavam concentrados no sudeste e no sul do país, onde, por sua vez, situava-se o pólo dinâmico da nossa economia. Contudo, uma economia forte, mas desmoralizada pela escravidão não podia se apresentar como esperança e promessa para um país.
No plano internacional as coisas eram ainda mais complicadas. A Guerra de Secessão (1861-1865) nos Estados Unidos havia mostrado que o escravismo não tinha futuro. Desde a eclosão da Revolução Industrial na Inglaterra, no século XVIII, o trabalho livre foi ganhando espaço e, no final do século XIX, apenas o Brasil, em companhia de países como Cuba e Costa Rica, insistia em manter um sistema social condenado e vergonhoso.
- A lei do Ventre Livre (1871).
Foi nesse ambiente que o ministério chefiado pelo visconde do Rio Branco apresentou o projeto da lei do Ventre Livre em maio de 1871 para a Câmara dos Deputados. Depois de modificada e adaptada aos interesses escravistas, a lei que declarava livres os filhos de escravos foi finalmente aprovada em 1871, por 65 votos a favor e 45 contra. A maioria dos deputados de Minas, São Paulo e Rio de Janeiro votou contra, acompanhados pelos deputados do Espírito Santo e do Rio Grande do Sul. Os representantes das províncias do norte e nordeste votaram maciçamente a favor.
Essa lei que apenas jogava para o futuro a solução do problema foi, entretanto, considerada pelo governo e pelos escravistas como solução definitiva. Não era essa a opinião dos abolicionistas brasileiros. Em 1880, o debate retornou com maior vigor.
- As agitações abolicionistas.
No Rio de Janeiro, no ano de 1880, os abolicionistas fundaram duas sociedades a fim de organizar a sua luta: a Sociedade Brasileira contra a Escravidão e a Associação Central Emancipacionista. Publicações diversas começaram a circular, pregando a abolição. Outras sociedades, no mesmo molde que as da capital, foram organizadas em várias províncias.
A luta abolicionista se ampliou e criou condições para a organização da Confederação Abolicionista (1883), que unificou o movimento no plano nacional.
Naturalmente, a abolição da escravatura não foi obra exclusiva dos abolicionistas que, em sua maioria, eram moradores das cidades. Como demonstram as fugas e rebeliões ao longo de toda a história do Brasil, os escravos não permaneceram passivos. A possibilidade de um levante escravo de grandes proporções foi considerada e atemorizou os escravistas, enfraquecendo a sua resistência ao movimento.
Os cafeicultores paulistas foram particularmente atingidos pelo movimento de fuga dos escravos promovido e apoiado pelos caifases, organizados por Antônio Bento, que foi juiz de paz e juiz municipal e nos cargos que ocupou defendeu sempre os escravos contra a opressão senhorial.
Na década de 1880, o poder escravista foi seriamente abalado e o Império, atingido em seus alicerces.
- A lei Saraiva-Cotegipe ou lei dos Sexagenários (1885).
A camada dominante escravista viu-se, então, forçada a novas concessões, que tinham por objetivo frear o movimento abolicionista. A lei Saraiva-Cotegipe de 1885, ao estabelecer a liberdade aos escravos com mais de 60 anos, teve exatamente esse propósito.Tratava-se de uma lei de alcance insignificante diante das exigências cada vez mais radicais de abolição imediata da escravatura.
Assim, fora do Parlamento o desespero tomou conta dos escravistas, pois os escravos abandonavam as fazendas sob estímulo e proteção de organizações abolicionistas. Para impedir as fugas, os escravistas chegaram a convocar o próprio exército, que, entretanto, se recusou, sob a alegação de que "o exército não é capitão-do-mato" e por julgar a missão indigna dos altos propósitos para que fora instituído.
- A lei Áurea (1888).
Finalmente, a 13 de maio de 1888, a princesa Isabel, que na ausência de D. Pedro II assumira a regência, promulgou a lei Áurea, declarando extinta a escravidão no Brasil.
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