terça-feira, 3 de novembro de 2009

Diário Carioca, 3 de abril de 1964

"Montevidéu - O Sr. João Goulart é esperado neste páis com honras de Chefe de Estado - é o telegrama da "United Press International" distribuído, ontem, aos jornais brasileiros.

Grande número de parlamentares e jornalistas se dirigiu ao Aeroporto de Carrasco momentos após ter a Rádio Farroupilha, do Rio Grande do Sul, anunciado apêlo do presidente deposto no sentido de que cessasse a resistência "para evitar derramamento de sangue".

Decidiram as autoridades uruguaias que o presidente deposto seja recebido com honras de Chefe de Estado. Diz mais o telegrama da agência norte-americana que a fronteira está patrulhada por fôrças leais ao Sr. João Goulart. Está garantido qualquer pedido de asilo, para tanto, sido enviadas tropas uruguaias à linha demarcatória dos dois países.

Um destróier uruguaio foi enviado para as proximidades da costa brasileira, prevendo-se a possibilidade de conflitos na fronteira, onde as guarnições continuam leais ao presidente deposto.

O Legislativo reuniu-se, extraordinariamente, para discutir a oportunidade de enviar uma mensagem ao Brasil. Ante a discussão não decisiva, entre as facções favoráveis e contrárias, foi suspensa a sessão. (ANSA - UPI - DC)

Até o momento de encerrármos os trabalhos desta edição não havia confirmação oficial da chegada do Sr. João Goulart a Montevidéu. Não se confirmaram, igualmente, as notícias de que o presidente Goulart havia se dirigido cara a capital Paraguaia, Assunção. Notícias de Pôrto Alegre informavam, entretanto, que Jango havia deixado aquela cidade na tarde de ontem."

"Dando por encerrada a "Rêde da Legalidade", às 13 horas de ontem, o prefeito de Pôrto Alegre, Sr. Sereno Chaise, leu a nota oficial alusiva ao ato, salientando em certo trecho que o presidente João Goulart, ao transitar pela capital sulina, dispensara o sacrifício da população gaúcha e de todo o Brasil na resistência ao movimento que o derrubara do poder.

É o seguinte, na íntegra, a nota: "Ás primeiras horas de hoje, o presidente João Goulart chegou a Pôrto Alegre. Depois de ficar algum tempo, seguiu viagem. Antes examinou, com autoridades militares, amigos e correligionários, as condições de resistir ao processo golpista e decidiu dispensar o sacrifício do povo gaúcho e brasileiro.

O deputado Leonel Brizola pede ao povo gaúcho e brasileiro, a todos os patriotas, que enfrentem com serenidade e calma esta difícil passagem.

Encerramos a "Rêde da Legalidade", agradecendo a todo o povo gaúcho e brasileiro que compareceu em massa à sede da Prefeitura de Pôrto Alegre para resistir contra os golpistas. Fizemos tudo para manter a legalidade."

"Confirmando que o esquema do golpe estava montado há algum tempo, o general Olímpio Mourão Filho, já nomeado pelo ministro da Guerra presidente da Petrobrás, falou, ontem, à imprensa, do gabinete do general Costa e Silva.

Afirmou aquêle militar que antes de iniciar sua marcha teve de realizar três operações: silêncio, gaiola e Popay. A primeira consistiu em articular todo o movimento para que não pudesse ser fracassada a marcha do Exército revolucionário, a segunda para propiciar o clima de tranqüilidade do povo, prendendo os líderes que atuavam nas massas trabalhadoras e, a terceira, operação guerra.

As declarações do novo presidente da Petrobrás foram assistidas por vários chefes militares e personalidades do mundo politico-militar.

"Se não ocorresse a prisão dos líderes sindicais - afirmou - nós teríamos a marcha dificultada, pois não conseguiríamos rapidamente o apoio maciço dos companheiros".

O general Olímpio Mourão disse também que "saímos para lutar, prontos para qualquer situação. Felizmente, em lugar do primeiro tiro, encontramos os abraços dos nossos companheiros de farda, porque êles pensavam como nós" (...)"

O Dia, 2 de abril de 1964

"O Sr. Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados, poderá assumir ainda hoje a Presidência da República, em virtude do que dispõe o artigo 79 parágrafo 2o da Contituição, que declara: - Vagando os cargos de Presidente e Vice Presidente da República, far-se á eleição 60 dias depois de abertas a última vaga. Se as vagas ocorrerem na segunda metade do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita 30 dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma estabelecida em lei. Em qualquer dos casos, os eleitos deverão completar o período dos seus antecessores.

Em consequência, o Sr. Ranieri Mazzilli deverá exercer a Presidência até a posse do novo presidênte, a ser eleito no dia 1o de maio próximo pelo Congresso Nacional."
"Em face da absoluta normalidade reinante na cidade com a cessação dos motivos que a determinaram, terminou à zero hora de hoje a greve geral decretada terça-feira.

Todos deverão retornar tranqüilamente ao trabalho, evitando, contudo, aglomerações públicas nas ruas.

Sòmente os bancos ainda permanecerão fechados, hoje e amanhã, em virtude de decreto."

"Brasília, 1o - Até às 22 horas de hoje o Sr. João Goulart ainda se encontrava na Granja do Torto, nesta capital, em companhia de sua espôsa e filhos.

No aeroporto militar, achava-se, pronto para decolar a qualquer instante um "Coronado", moderno jato da Varig, que tanto poderia se dirigir para Buenos Aires como para a Espanha, segundo afirmam fontes ligadas à família presidencial.

Após chegar a Brasília, às 15 horas, o Sr. João Goulart estêve no Palácio do Planalto uns 15 minutos, fechado em seu gabinete, retirando-se depois para a Granja do Torto, onde recebeu poucas pessoas, uma delas o deputado Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados. Pessoas, que privam com o Sr. Mazzilli, afirmam que êste ouviu do Sr. João Goulart a declaração de que, antes de partir de Brasília, lhe transmitiria o cargo de Presidente da República. Outras fontes adiantam que o Sr. João Goulart, durante a tarde, estêve redigindo o documento de renúncia, que será enviado ao Congresso de Pôrto Alegre, para onde irá nas próximas horas."

"Pôrto Alegre, 1o - O Sr. João Goulart, cêrca das 23 horas, chegou a esta capital em companhia de sua família e do Sr. darci Ribeiro. Antes de embarcar em Brasília, o Sr. João Goulart conferenciou novamente com o Presidente Ranieri Mazzilli." (...)

"Às treze horas o Sr. João Goulart deixava o Rio, indo para Brasília e, pouco depois, a Cadeia da Liberdade anunciava que o Sr. Goulart havia partido nim avião da Varig para destino ignorado. Todos os comandos militares haviam aderido ás tropas do general Castelo Branco. Em recife soldados do IV exército cercaram o Palácio do Governador e prenderam o Sr. Miguel Arrais, por ordem do general Justino Alves.

O ministro Lafaiete de Andrade enviou emissário a Minas para decretar solidariedade ao Supremo Tribunal Federal à revolução.

Às 16 horas, foi lida esta ordem, firmada pelo general Castelo Branco:

"Que as tropas do I Exército cessem todas as operaçòes e voltem aos quartéis".

Era o fim da resistência e a vitória da Revolução.

As autoridades civis e militares estão lembrando a tôda a população que estão em vigor as leis e os códigos. Os culpados por atos condenáveis serão punidos. Aconselham que a população se abstenha de participar de aglomerações e movimentos coletivos. Avisam ainda que a normalidade voltou ao País e cessaram, imediatamente, todos os movimentos grevistas."

"Dezenas de automóveis trafegaram pelo centro da cidade, tocando suas businas, em sinal de alegria pela vitória da democracia em todo o País. As estações de rádio e televisão, que estavam sob censura, iniciaram suas transmissões normais, pouco depois das 17 horas. Os contingentes de fuzileiros navais que ocupavam as redações de alguns jornais, foram recolhidos aos quartéis.

Por volta das 17,15, o Forte de Copacabana anunciava, com uma salva de canhão, a aproximação das tropas do general Amauri Kruel, que atingiria o Estado da Guanabara às últimas horas da noite de ontem.

A população de Copacabana saiu ás ruas, em verdadeiro Carnaval, saudando as tropas do Exército. Chuvas de papéis picados caíam das janelas dos edifícios enquanto o povo dava vazão, nas ruas, ao seu contentamento. (...)"

Tribuna da Imprensa, 2 de abril de 1964

"Escorraçado, amordaçado e acovardado deixou o poder como imperativo da legítima vontade popular o sr. João Belchior Marques Goulart, infame líder dos comuno-carreiristas-negocistas-sindicalistas. Um dos maiores gatunos que a história brasileira já registrou, o Sr. João Goulart passa outra vez à história, agora também como um dos grandes covardes que ela já conheceu.

Temos o direito de dizer tudo isso do Sr. João Goulart porque não lhe racionamos os adjetivos certos, por mais contundentes que fossem, na hora em que êle dominava o poder, e posava de líder todo-poderoso da Nação. Como não nos intimidamos na hora em que Jango e os comunistas estavam por cima e amargamos até cadeia, não precisamos nem fazer a demagogia da generosidade. Mesmo porque nào pode haver generosidade nem contemplação com canalhas. E Jango, Jurema, Assis Brasil, Arraes, Dagoberto, Darcy Ribeiro, Waldir Pires e toda a quadrilha que assaltou o poder não passam de canalhas.

E além de canalhas, covardes. E além de covardes, cínicos. E além de cínicos, pusilâmines. E além de pusilâmines, desonestos. Bravatearam, fingiram-se machões, disseram que fariam isto e aquilo, mas aos primeiros tiros sairam correndo espavoridos e ainda estão correndo até agora. Alguns, como Aragão, como Assis Brasil, como Crisanto de Figueiredo, como Arraes, como Cunha Melo, como todo o rebotalho comunista, não serão encontrados tão cedo. (...)

Nunca se viu homens tão incapazes, tão desonestos e tão covardes. Agora que o País se livrou do fantasma da comunização podemos repetir o que vinhamos dizendo exaustivamente: todo comunista é covarde e mau caráter. Os episódios de agora vieram provar que estávamos cobertos de razão. (...)

O Povo brasileiro lavou a alma. O Carnaval que se comemorou ontem em plena chuva só poderia mesmo ter sido feito por um povo que estava precisando dessa desforra que lhe era devida precisamente há 30 meses. O povo que comemorou ontem a queda de jango foi o mesmo que votou contra êle em 1960 e foi traído pela renúncia de Jânio. A comemoração de hoje é pois uma revanche e uma recuperação.

Precisamos agora de organizar o mais ràpidamente possível o nôvo govêrno, pois os aproveitadores de sempre já cerram fileiras em tôrno dos cargos, já se apresentam como os heróis de uma batalha que não travaram. Junto com a organização do nôvo govêrno temos que providenciar, também urgentemente, para que os direitos políticos dos que foram ontem legitimamente banidos pelo povo, sejam cassados para sempre. (...)

Não se trata de vingança, nem estamos aqui defendendo o esquartejamento dos derrotados. Mas quando o destino do País está em jôgo, quando se trata de decidir da sorte dos que queriam comunizar o País, não podemos ser generosos ou sentimentais. Para os civis, cassação dos direitos políticos. Para os militares como Assis Brasil, Crisanto, Cunha Melo, Napoleão Nobre, Castor da Nóbrega e para todos os comuno-carreiristas das Fôrças Armadas, o caminho é um só e inevitável: a reforma pura e simples. Não falavam tanto em reforma? Pois apliquemos a fórmula a êles.

Enfim, começa hoje uma nova era para o Brasil. Confiemos no espírito público dos homens que salvaram a democracia brasileira, e no discernimento e superioridade com que o marechal Dutra se conduzirá nos próximos 22 meses."

Diário de Notícias, 2 de abril de 1964

"À partir da tarde de ontem, principalmente depois que desceram os tanques da Vila Militar, dez dos quais foram colocados em frente ao Ministério da Guerra, onde também se encontram numerosos carros blindados e de combate, a crise político-militar pareceu assumir aspectos realmente perigosos, com a cidade sob o domínio de grande tensão e povo como que à espera de uma revolução a qualquer momento.

Á margem dos preparativos da população como que para prevenir-se, sacando nos bancos e adquirindo mantimentos, ocorreram diversos incidentes entre populares e policiais, e dos quais o de maior gravidade se verificou na Federação dos Estivadores, na rua Santa Luzia. Á esta altura, em consequência da paralisação dos trens da Central e da Leopoldina, respectivamente, às 17h30m e às 19h30m, a cidade parecia em colapso no setor de transportes, com grandes filas se formando ao longo dos pontos de ônibus e lotações para a Zona Norte e cidades fluminenses. As sédes das ferrovias e os demais próprios federais passaram, então, a ser guarnecidos por tropas do Exército. A tensão crescia à medida que circulavam as notícias sôbre a situação em Minas, onde já se teria iniciado a revolução. Tôda Minas, principalmente a capital e cidades como Governador Valadares e Juiz de Fora, já anteriormente agitadas, estavam, segundo os comentários, "pegando fogo". As rodas de populares discutindo política se formavam e não eram poucos os incidentes registrados entre os mais exaltados."

"A perspectiva mais alarmante da situação brasileira funda-se num dado concreto que não é possível obscurecer. É o fato de que jamais em nossa História, e até o presente, as esquerdas radicais - nomeadamente o comunismo e suas clássicas correntes auxiliares - estiveram tão à vontade, desfrutaram tanto prestígio e aproximaram-se tanto do êxito quanto no momento atual.

Por mais que negaceie, tergiverse e dissimule, o Sr. João Goulart, ninguém poderá negar - porque está à vista de todos, porque é público e ostensivo - que os elementos chamados de "formação marxista" não somente conseguiram infiltrar-se fàcilmente em todos os postos, como também são os preferidos pelo govêrno para êsses postos, sobretudo os de comando e de direção.

Atualmente, no presente govêrno, que ainda se diz democrata, a ideologia marxista e mesmo a militância comunista indisfarçada constituem recomendação especial aos olhos do govêrno. Como se já estivéssemos em pleno regime "marxista-leninista", com que sonham os que desejam incluir sua pátria no grande império soviético, às ordens do Kremlin. (...)"
Diário de Notícias, 1 de abril de 1964



"Enquanto o Congresso Nacional iniciava, em plena madrugada, em Brasília, a votação do "impeachment" do Sr. João Goulart, homiziado no sul, numa sessão tumultuada pela oposição do PTB, que ameaçava ir até o esfôrço físico para impedir o debate da matéria, o general Amauri Kruel chegava a São Paulo para conferenciar com o governador Ademar de Barros e ultimar os preparativos para os deslocamentos das tropas que deverão seguir para o Rio Grande do Sul a fim de esmagar o último foco de rebelião concentrado em Pôrto Alegre, sob o comando do Sr. João Goulart e Leonel Brizola.

Ao mesmo tempo, deverão ser abastecidos, hoje, em Santos, os três navios da esquadra, Tamandaré, Pará e Amazonas, que segundo se anuncia, sob o comando geral do almirante Sílvio Heck, rumam para o sul a fim de cooperar no completo esmagamento dos insurretos.

Ao mesmo tempo, por ordem do Sr. Ademar de Barros, começa hoje em São Paulo, o racionamento de gasolina fixado em 70% para as indústrias e transportes coletivos e, em 30% para os carros particulares. A medida vai afetar profundamente o abastecimento de Brasília uma vez que o govêrno do Estado requisitou todos os estoques que transitam em direção à capital federal."

Correio da Manhã, 1 de abril de 1964

"A Nação não mais suporta a permanência do Sr. João Goulart à frente do Govêrno. Chegou ao limite a capacidade de tolerá-lo por mais tempo. Não resta outra saída ao Sr. João Goulart senão a de entregar o Govêrno ao seu legítimo sucessor. Só há uma coisa a dizer ao Sr. João Goulart: saia.

Durante dois anos o Brasil agüentou um Govêrno que paralisou o seu desenvolvimento econômico, primando pela completa omissão, o que determinou a completa desordem e a completa anarquia no campo administrativo e financeiro.

Quando o Sr. João Goulart saiu de seu neutro período de omissão foi para comandar a guerra psicológica e criar o clima de intranqüilidade e insegurança que teve o seu auge na total indisciplina que se verificou nas Forças Armadas.

Isso significou e significa um crime de alta traição contra o regime, contra a República, que êle jurou defender.

O Sr. João Goulart iniciou a sedição no país. Não é possível continuar no poder. Jogou os civis contra os militares e os militares contra os próprios militares. É o maior responsável pela guerra fratricida que se esboça no território nacional.

Por ambição pessoal, pois sabemos que o Sr. João Goulart é incapaz de assimilar qualquer ideologia, êle quer permanecer no Govêrno a qualquer preço.

Todos nós sabemos o que representa de funesto uma ditadura no Brasil, seja ela de direita ou de esquerda, porque o povo, depois de uma larga experiência, reage e reagirá com tôdas as suas fôrças no sentido de preservar a Constituição e as liberdades democráticas.

O Sr. João Goulart não pode permanecer na Presidência da República, não só porque se mostrou incapaz de exercê-la como também porque conspirou contra ela como se verificou pelos seus últimos pronunciamentos e seus últimos atos.

Foi o Sr. João Goulart quem iniciou de caso pensado uma crise política, social e militar, depois de ter provocado a crise financeira com a inflação desordenada e o aumento do custo de vida em proporções gigantescas.

Qualquer ditadura, no Brasil, representa o esmagamento de tôdas as liberdades como aconteceu no passado e como tem acontecido em todos os países que tiveram a desgraça de vê-la vitoriosa.

O Brasil não é mais uma nação de escravos. Contra a desordem, contra a masorca, contra a perspectica de ditadura, criada pelo próprio Govêrno atual, opomos a bandeira da legalidade.

Queremos que o Sr. João Goulart devolva ao Congresso, devolva ao povo o mandato que êle não soube honrar.

Nós do Correio da Manhã defendemos intransigentemente em agôsto e setembro de 1961 a posse do Sr. João Goulart, a fim de manter a legalidade constitucional. Hoje, como ontem, queremos preservar a Constituição. O Sr. João Goulart deve entregar o Govêrno ao seu sucessor, porque não pode mais governar o país.

A Nação, a democracia e a liberdade estão em perigo. O povo saberá defendê-las. Nós continuaremos a defendê-las."

Jornal do Brasil, 1 de abril de 1964

"Quem chegasse às 8h30m da noite de ontem ao Edifício do Jornal e da Rádio Jornal do Brasil não poderia entrar pois encontraria na porta, metralhadora em punho, um fuzileiro naval. E se olhasse pela parede de vidro dos estúdios da Rádio teria a impressão de assistir a um filme de gangsters: quatro outros fuzileiros, comandados pelo Tenente Arinos, moviam-se como gorilas pelo estúdio, seus movimentos tolhidos pelas metralhadoras que ameaçavam microfones, painéis de instrumentos e os funcionários, estupefatos com aquela irrupção de selvajaria tecnológica em plena Avenida Rio Branco.

Era o Brasil regredindo ao estado de republiqueta latino-americana. Os fuzileiros navais, ao chegarem, dispararam dois tiros para o ar diante do prédio e entraram de metralhadoras em punho, pistolas na cinta, até o 5o andar. Tinham ordem de quem? indagamos. Do Ministro da Marinha, disseram. Onde está a ordem? Era verbal. Da Rádio, o Tenente telefonou a um Almirante, sem lhe dizer o nome. O prédio era muito grande, disse. Precisavam reforços. Deixaram dois de guarda na Rádio, outro na porta da rua e foram em busca dos tais reforços, sem dúvida para ocuparem todas as dependências do Jornal do Brasil.

Mas deve estar em desespêro o Govêrno do Sr. João Goulart. Dentro de meia hora, em lugar dos reforços, veio a ordem de retirar. Amontoados no elevador, capacetes na cabeça, metralhadoras se entrechocando e se apoiando nas costelas dêles próprios, desceram. E passaram diante de populares boquiabertos, na calçada da rua.

Quem humilha assim os bravos Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil? Quem os transforma primeiro em gangsters violentos e os faz evacuar em seguida, confusos, um pugilo de homens envergonhados sob o pêso de tanto material bélico? Quem estimula a indisciplina de marujos e fuzileiros e depois os transforma em bandidos e em seguida em pobres diabos pilhados em flagrante?

A partir de 13 de março o Sr. João Goulart tem injuriado muitos, em muito pouco tempo. Agora, ao que tudo indica, já lhe resta muito pouco tempo para injuriar quem quer que seja."

Ao primeiro minuto de hoje teve início a greve geral em todo o país, por determinação do Comando Geral dos Trabalhadores e em apoio ao Presidente João Goulart, paralisando de imediato os trens da Central do Brasil e da Leopoldina, o Pôrto de Santos e os bondes da Guanabara, com a adesão de universitários.

A decisão da greve foi precipitada pela prisão ontem, no Sindicato dos Estivadores, de vários lideres sindicais pela Polícia Política da Guanabara. A Federação Nacional dos Marítimos, que decretou a greve ontem à noite, denunciou o desaparecimento de quatro estivadores, um líder sindical de Vitória e do Dr. Antônio Pereira Filho, líder dos bancários.

O Partido Comunista Brasileiro responsabilizou ontem os grupos radicais pela precipitação da crise política, tachando de imprudente a tática utilizada por líderes extremados. Acha o PCB que tal atitude conduzirá à união do centro contra a direita, neutralizando assim a ação dos setores mais moderados da esquerda, e que, no seu entender, levará à deposição do Presidente da República, com lastro na opinião pública."

O Governador Carlos Lacerda, embora tenha dito ao seu Secretariado que não acredita na crise nacional, montou um esquema de segurança para o Palácio Guanabara e para as ruas a êle adjacentes, com a qual pretende resistir contra qualquer intervenção federal no Estado da Guanabara.

Às três horas de hoje o Palácio Guanabara deu nota oficial informando que os fuzileiros para lá se dirigiram e chamava o povo para defender o Governador.

Cêrca de 500 homens da Polícia Militar, sob a ordem direta do Secretário de Segurança, General Salvador Mandim, são empregados na defesa do Palácio do Govêrno. Barricadas foram construídas com sacos de areia e os militares permanecem em regime de prontidão."

O Golpe Militar de 1964 - (Jornais e Reportagens)

"O Presidente da República sente-se bem na ilegalidade. Está nela e ontem nos disse que vai continuar nela, em atitude de desafio à ordem constitucional, aos regulamentos militares e ao Código Penal Militar. Êle se considera acima da lei. Mas não está. Quanto mais se afunda na ilegalidade, menos forte fica a sua autoridade. Não há autoridade fora da lei. E, os apelos feitos ontem à coesão e à unidade dos sargentos e subordinados em favor daquele que, no dizer do próprio, sempre estêve ao lado dos sargentos, demonstra que a autoridade presidencial busca o amparo físico para suprir o carência de amparo legal.

Pois não pode mais ter amparo legal quem no exercício da Presidência da República, violando o Código Penal Militar, comparece a uma reunião de sargentos para pronunciar discurso altamente demagógico e de incitamento à divisão das Forças Armadas. (...)"
Jornal do Brasil, 31 de março de 1964

Contradições do Modelo de Desenvolvimento dos Anos 50

  • Os desequilíbrios econômicos e sociais

O modelo de desenvolvimento brasileiro que se definiu durante a presidência de Juscelino não estava isento de contradições, que, aliás, tornaram-se claras na década de 1960. Desde o primeiro governo de Getúlio, o Estado assumiu a forma de empresário privilegiado, investindo diretamente na criação de unidades produtivas. O recurso financeiro para tais empreendimentos foi obtido através de uma política fiscal voltada para esse fim e também, sempre que necessário, através de emissões. Por isso, uma das conseqüências principais foi o recrudescimento da inflação, que levou à rápida perda do poder aquisitivo da moeda. Conseqüentemente, os detentores do capital foram impelidos aos investimentos, para evitar o seu desgaste.
O estímulo ao investimento motivado pela inflação teve um efeito nefasto no corpo social, principalmente porque atingiu os assalariados. De certa maneira, é possível dizer que, através desse mecanismo, transferiram-se, indiretamente, os recursos dos assalariados para o setor empresarial. Em outros termos, os ricos ficaram cada dia mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. Para piorar ainda mais a situação, os investimentos naturalmente resultaram no incremento da tecnologia. Com isso, restringiu-se a criação de novos empregos, atirando os excedentes populacionais em setores agrícolas, agropecuários, da indústria extrativa - que eram frágeis -, ou então ao comércio e ao setor de serviços, em que o subemprego tornou-se inevitável, dando origem a um “subproletariado marginal urbano”.
Ao aprofundamento das diferenciações sociais correspondeu, no plano econômico, o agravamento das disparidades setoriais e regionais na produção. Em outras palavras, os investimentos não foram realizados de maneira generalizada e igual em todos os setores produtivos. Evidentemente, os investidores selecionaram as oportunidades que a eles se afiguravam como mais rentáveis. Em conseqüência, alguns setores - como o têxtil - permaneceram praticamente estagnados. Além do mais, os investimentos foram feitos de forma especulativa, provocando o "inchaço" de alguns setores, o que indicava alto grau de concentração de capitais. Foi o caso do setor da construção e a correspondente especulação imobiliária.
O entrelaçamento dos desequilíbrios sociais e econômicos é bem ilustrativo das profundas contradições do modelo do desenvolvimento adotado na década de 1950.
A inflação, como sabemos, tem um efeito corrosivo sobre os salários, diminuindo o seu poder aquisitivo. Se esse aspecto é a contrapartida da acumulação de capitais em mãos da burguesia, por outro lado, ao diminuir a capacidade aquisitiva do salário, a inflação tem como resultado a contração da demanda e, portanto, a restrição do mercado consumidor. A longo prazo, isso torna inviável o desenvolvimento industrial autônomo. Disso resulta a grande dificuldade enfrentada pelo governo de elevar o nível de vida da população, pois a elevação do salário, para neutralizar a elevação do custo de vida e combater a carestia, implica necessariamente a sua incorporação ao custo da produção, restabelecendo a tendência de alta dos preços. Assim se explica o círculo vicioso do governo Goulart, em que a corrida do salário e do preço apenas serviu para agravar o processo inflacionário, criando inquietações sociais difíceis de acalmar.

  • As multinacionais
Ao lado dos problemas internos gerados pelo modelo de industrialização, um outro se apresentou, e este com maior peso: a penetração e consolidação das empresas multinacionais. Desde Juscelino (Plano de Metas), a instalação de multinacionais no Brasil foi maciça. A partir de então, os setores fundamentais da indústria foram passando para o controle estrangeiro. Segundo Gabriel Cohn, o controle externo das indústrias automobilísticas, de cigarro e de eletricidade variou em torno de 80% a 90%. Nas indústrias farmacêutica e mecânica, a proporção foi de 70%.
O resultado principal dessa nova conjuntura foi a minimização da importância da burguesia nacional, que passou para o plano secundário, muitas vezes como sócio menor das grandes corporações internacionais. Isso significa que os postos de comando de tais indústrias estavam em mãos de indivíduos diretamente designados pela direção da matriz estrangeira, ou seja, os centros de decisões se encontravam fora do país. Essa situação levou ao inevitável agravamento do desequilíbrio no Balanço de Pagamentos: a remessa de lucros para o exterior, além dos pagamentos pelo uso de marcas e patentes (royalties) e da importação de maquinaria, superou rapidamente o capital que as multinacionais inicialmente investiram.
Naturalmente, as contradições engendradas pelo modelo de desenvolvimento da industrialização adotado na década de 1950 expressaram-se através do aguçamento das lutas sociais e políticas. A presença do capitalismo internacional e o seu papel cada vez mais decisivo no controle de nossa economia tiveram, por seu turno, uma importância certamente não desprezível no desfecho da luta. O movimento militar de 1964 teve aí suas raízes e as suas razões.

Definindo o Caminho

  • Presença norte-americana

No início da década de 1950, embora as opções fossem claras, a definição em torno da industrialização via capital estrangeiro ou estatal ainda não era evidente. Mas a presença norte-americana já era visível em nossa economia.
Em 1951 a Comissão Mista Brasil-Estados Unidos reuniu-se para elaborar um grandioso projeto no setor energético e viário, em que uma considerável soma de capital norte-americano seria aplicada: cerca de 400 milhões de dólares. Em oposição a essa abertura ao capital estrangeiro, surgiu um maciço movimento de nacionalização do petróleo, sob o lema “O petróleo é nosso”. Em 1953, finalmente, o Congresso, pressionado pela força que o movimento atingira, aprovou a lei que instituiu o monopólio estatal da exploração e do refinamento do petróleo.
Obviamente, o triunfo da iniciativa de um setor nacionalista, formado a partir da coligação de intelectuais, militares, estudantes, políticos e lideres operários, não poderia ser bem recebido pelos Estados Unidos, que, por esse tempo, atingiam o ponto culminante da guerra fria, com intensas repercussões internas. Para o presidente Eisenhower, tal atitude por parte do Brasil não era mais do que o resultado de manobras de "inspiração comunista". Por isso passou a pressionar o governo de Getúlio, através do corte unilateral da ajuda econômica, reduzindo drasticamente o programa de empréstimo.
A partir de 1953, com o fim da Guerra da Coréia (1950-1953), teve início uma conjuntura extremamente desfavorável ao Brasil, devido à queda dos preços dos produtos primários no mercado internacional, motivada pelas manipulações dos Estados Unidos. A dificuldade de obter divisas com as exportações provocou uma crise financeira, de modo que o recurso de tomar empréstimos no exterior se tornou inevitável. A vinculação do Brasil ao capital internacional, particularmente ao norte-americano, começou então a delinear-se com clareza.

  • O segundo governo de Vargas (1951-1954)

O suicídio de Getúlio Vargas, em agosto de 1954, representou a vitória dos partidários do desenvolvimento dependente do capital estrangeiro. Contudo, seria um exagero atribuir o suicídio de Vargas apenas a essa questão e, sobretudo, emprestar a ele, postumamente, a imagem de um nacionalista intransigente. Contrariamente ao que se pode supor, o comportamento político de Getúlio em relação ao capital estrangeiro - ao imperialismo, em suma - era bastante flexível, e em nenhum momento se descartou por completo sua participação na economia brasileira. Getúlio só não concordava com o alinhamento completo do Brasil aos Estados Unidos, como estes pareciam desejar. Na verdade, recusava-se a atuar como peça subordinada ao capital estrangeiro.

  • O "desenvolvimentismo" juscelinista

A ascensão de Juscelino Kubitschek, em 1956, marcou o início do processo de industrialização inteiramente ajustado aos interesses do capital internacional. Apesar da composição das forças políticas que serviram de base para sua eleição, o governo juscelinista definiu com clareza o rumo da industrialização ao implantar o modelo desenvolvimentista, estreitamente associado ao capital estrangeiro. Parece estranho que isso possa ter ocorrido com um governo aparentemente herdeiro do getulismo, pois é preciso notar que João Goulart era seu vice-presidente e que sua candidatura triunfou através da velha coligação PSD-PTB.
Todavia, seria precipitado atribuir essa "guinada em favor do capital estrangeiro" a uma política deliberada de Kubitschek. Na realidade, sua posição diante do capital estrangeiro, tanto quanto a de Getúlio, era ambígua, e sua ambigüidade refletia a própria indecisão da formação capitalista no Brasil. De fato, a burguesia industrial brasileira sentia-se incapaz de conduzir o processo de industrialização em posição hegemônica, prensada como estava entre a participação do Estado e a do capital estrangeiro, representado pelas multinacionais.

  • A formação do modelo

A execução do Plano de Metas de Juscelino foi, nesse sentido, a grande responsável pela definitiva configuração do modelo de desenvolvimento industrial que o Brasil finalmente adotaria. Efetivamente, com esse ambicioso plano, a penetração do capital estrangeiro ocorreu de forma maciça, ocupando os ramos da indústria pesada: indústria automobilística e de caminhões, de material elétrico e eletrônico, de eletrodomésticos, de produtos químicos e farmacêuticos, de matéria plástica. Iniciou se aí a organização das multinacionais, que, monopolizando aquele que viria a ser o setor mais dinâmico da economia, estavam destinadas a exercer inegável influência na redefinição da orientação econômica e, também, política do Brasil.
Segundo ainda o Plano de Metas, o capital estatal ficou encarregado de viabilizar o programa da infra-estrutura destinado a sustentar o modelo, através da construção de rodovias e da "ampliação do potencial de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica".

  • Significado econômico de 1964

Esse modelo de desenvolvimento econômico, que ganhou forma com Juscelino, seria retomado a partir de 1964, fazendo do movimento militar que derrubou João Goulart o seu herdeiro direto. Com o regime instalado em 1964, o modelo foi levado às suas últimas conseqüências. Houve, porém, uma considerável diferença entre os períodos de 1955 a 1965, aproximadamente, e de 1965 em diante. No primeiro período, apesar da maciça presença do capital estrangeiro, procurou-se através dele dirigir toda a força econômica para a dinamização do mercado interno. De 1965 em diante, a nova estratégia, com base na mesma força econômica, passou a orientá-la, entretanto, para o mercado mundial.
Nesse sentido, o movimento militar de 1964 e o regime implantado a partir daí podem ser vistos como resultado, entre outras coisas, da luta entre aqueles que procuravam enquadrar as multinacionais às perspectivas da economia brasileira e aqueles que, inversamente, desejavam o enquadramento da economia brasileira à perspectiva econômica das multinacionais. O desfecho da luta, em 1964, foi a vitória da última tendência. Para Paul Singer, o movimento militar de 1964 "coincide com uma redivisão internacional do trabalho, que as multinacionais estão levando a cabo em todo mundo capitalista, e que consiste precisamente em transferir a países semi-industrializados, como o Brasil, determinadas linhas de produção industrial. A crescente exportação de bens industrializados pelas multinacionais instaladas no Brasil aumenta a importância destas empresas no cenário econômico nacional, pois delas passa a depender cada vez mais a Balança de Pagamentos. Sendo estes bens adquiridos por subsidiárias nos países importadores das mesmas multinacionais que os exportam - como da Ford do Brasil, que fornece motores à sua matriz americana -, sua presença no Brasil passa a se justificar não apenas por trazerem recursos de capital e know-how técnico, mas também por assegurarem mercado para uma parcela crescente de nossas exportações".

Em Busca do Modelo de Industrialização

  • Características industriais de 1950

Nos inícios dos anos 50, a indústria brasileira apresentava dois aspectos salientes: de um lado, empreendimentos centrados na produção de bens perecíveis e semiduráveis, destacando-se particularmente as indústrias têxtil, alimentar, gráfica, editorial, de vestuário, fumo, couro e peles; de outro, empresas inteiramente nacionais, normalmente gerenciadas pelo núcleo familiar proprietário. Quanto a estas últimas - segundo o economista Paul Singer –, embora algumas "tivessem dado mostras da apreciável capacidade de expansão via auto-acumulação, chegando a se constituir alguns ‘impérios industriais’ (como os de Francisco Matarazzo e Ermírio de Moraes), estava claro que nenhuma tinha possibilidade de mobilizar os recursos necessários para efetivamente iniciar a indústria pesada no país".
Efetivamente, a industrialização em 1950 não estava ainda completa, pois, segundo o mesmo autor, a produção de bens perecíveis e semiduráveis de consumo não conduziu a indústria além dos limites da demanda por esse tipo de produto. Para compreender melhor o passo seguinte na industrialização, vejamos quais as partes essenciais de um sistema industrial completo. Segundo os economistas, as indústrias estão articuladas da seguinte maneira: indústria de consumo, que se caracteriza pela produção de bens e serviços destinados à direta satisfação dos consumidores (alimentos, roupas, diversões, sapatos, fumo, couro); indústria de bens intermediários, que produz bens que necessitam de transformações finais para se converterem em produtos aptos ao consumo (gusa para diversas indústrias, trigo para o padeiro, etc.); e, finalmente, a indústria de bens de capital, que não se destina à produção de bens imediatamente consumíveis, sendo organizada para dar eficiência ao trabalho humano, tornando-o mais produtivo (máquinas, estradas, portos, etc.).
Pois bem, no Brasil havia quase que exclusivamente a indústria de consumo, ou leve, que se dedicava à produção de "bens perecíveis e semiduráveis”. Desse modo, a implantação definitiva do sistema industrial dependia do encontro de soluções para a implantação da indústria pesada, produtora de bens duráveis de consumo, bens intermediários e bens de capital.

O Desenvolvimento Econômico do Brasil durante o período do populismo

O processo de industrialização do Brasil remonta aos últimos decênios do século XIX. O seu ponto de partida situa-se por volta da década de 80 do século passado, motivado essencialmente pela crise e abolição do trabalho escravo. Formou-se, com o trabalho livre assalariado, um mercado passivo que era preciso abastecer.
A segunda fase da "luta pela industrialização" situa-se no período da Primeira Guerra, quando as potências capitalistas, momentaneamente, sustaram o fornecimento de manufaturas, deixando um espaço vazio que deu origem ao processo de "substituição das importações”. Mas, tão logo os conflitos terminaram, as potências industriais retomaram sua vida econômica, na ânsia de preencher os campos vazios que haviam deixado.
Ora, em 1929, sobreveio a grave crise do sistema capitalista, que, de certa forma, relaciona-se à terceira fase, iniciada em 1930, com a revolução. Nessa fase, a industrialização ganhou corpo e se firmou. Em primeiro lugar, pela falência do federalismo da República Velha e pela implantação de um Estado fortemente centralizado, culminando na instituição da ditadura de Vargas (Estado Novo). Em virtude disso, formou-se um mercado verdadeiramente nacional para a indústria, em razão da quebra de barreiras entre as distintas unidades da federação, que facilitou a livre circulação de mercadorias, levando à fusão dos mercados isolados e locais. Além do mais, a construção de portos, ferrovias e rodovias, nesse período, integrou fisicamente as regiões dispersas. Porém e preciso acentuar que a industrialização assim empreendida não se difundiu igualmente por todo o Brasil. Ao contrário, concentrou-se em São Paulo, que se tornou o estado mais industrializado. Às vésperas da Segunda Guerra Mundial, a hegemonia industrial de São Paulo era um fato consumado.
Da Segunda Guerra até 1950, temos a quarta fase do processo de industrialização, induzido em grande parte pelos acontecimentos mundiais, marcando o final do "estilo de industrialização" que se havia inaugurado na década de 1930.
Na década de 1950 iniciou-se uma nova forma de industrialização, que se prolongou até a época atual. Segundo o sociólogo Gabriel Cohn, “a década de 1950 marca um ponto de inflexão no processo de industrialização”. E a razão apontada pelo mesmo autor é a seguinte: naquela década encerrou-se a etapa de ocupação do mercado "passivo", preexistente e disponível em virtude da "contradição da oferta de produtos importados". Dessa forma, o processo de industrialização chegou a um ponto crucial, pois o seu prosseguimento já não era mais possível com a ocupação episódica do mercado, que por uma ou outra razão havia sido momentaneamente abandonado pelas potências industriais dominantes. De fato, a continuidade da industrialização passou a depender daquele momento em diante da criação de um mercado dotado de dinamismo próprio e, portanto, autônomo.

É essa última etapa, iniciada em 1950, que nos interessa de perto.

Características do Populismo à brasileira

  • Origens

O período da história republicana do Brasil que vai da queda do Estado Novo (1945) ao movimento militar de 1964 é caracterizado como populismo. O populismo, entretanto, não foi um fenômeno político exclusivamente brasileiro, mas latino-americano, que floresceu no período pós-guerra. O termo populismo foi tomado de empréstimo à história política da Europa e serviu para designar, no século XIX, um movimento revolucionário russo conhecido como narodniki.
No Brasil, todavia, aquilo que se convencionou chamar de populismo não data propriamente do novo período que se abriu em 1945 e se encerrou em 1964. Ele mergulha suas raízes na revolução de 1930, configurando-se como produto do cruzamento entre o processo da crise política e o desenvolvimento econômico que então principiava.

  • Ambigüidade

Como produto de forças transformadoras e contraditórias, o populismo trazia a marca de suas origens: é essencialmente uma configuração política ambígua. Segundo o sociólogo Francisco Weffort, o populismo e, como "estilo de governo", sempre sensível às pressões populares; simultaneamente, como "política de massa", procura conduzir e manipular suas aspirações.
Ao mesmo tempo em que foi expressão da crise da forma oligárquica de governo, típica da República Velha, representou também a democratização do Estado, embora apoiado no autoritarismo.

  • Conclusões
O populismo foi, enfim, a expressão política do deslocamento do pólo dinâmico da economia - do setor agrário para o urbano -, através do processo de desenvolvimento industrial, em grande parte impulsionado pela revolução de 1930.
No plano social, tais transformações econômicas implicaram a emergência das classes populares urbanas, cujos anseios foram sistematicamente ignorados e reprimidos na República Oligárquica. Chama-se de populismo, nesse contexto, à forma de manifestação das insatisfações da massa popular urbana e, ao mesmo tempo, o seu reconhecimento e sua manipulação pelo Estado. Do ponto de vista da camada dirigente, o populismo é, por sua vez, a forma assumida pelo Estado para dar conta dos anseios populares e, simultaneamente, elaborar mecanismos para o seu controle.

República Populista

João Goulart (1961-1964)

  • Continuação da crise

Com a renúncia de Jânio, a presidência deveria ser assumida por João Goulart. Durante toda a sua vida política, Jango - como era popularmente conhecido - estivera ligado às forças getulistas e parecia ser o principal herdeiro de Vargas. Fora ministro do Trabalho no governo de Getúlio, vice-presidente de Juscelino e novamente reeleito vice de Jânio. Todavia, sua atuação política era identificada pelas forças conservadoras como notoriamente comunista; na União Soviética seu nome era citado com simpatia pelos jornais. Para fortalecer ainda mais essas opiniões, quando Jânio renunciou, Jango encon­trava-se em visita à China comunista, onde declarara, dirigindo-se ao líder do PC chinês, Mao Tsetung: "Congratulo-me com Vossa Excelência pelos triunfos obtidos pelo povo e pelo governo da República chinesa em sua luta heróica pelo progresso e pela elevação do padrão de vida do povo”. Evidentemente, tratava-se de uma deferência e de simples formalidade, pois declarações elogiosas ele fizera em outras ocasiões e em países absolutamente anticomunistas. No entanto, a saudação protocolar de Jango foi utilizada pelos conservadores como "prova" de que ele era comunista.

  • O agravamento da crise

Devido à ausência de Jango, a presidência foi assumida por Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados. Porém, efetivamente, o poder estava nas mãos dos três ministros militares - general Odílio Denys (ministro da Guerra), brigadeiro Moss (ministro da Aeronáutica) e almirante Sílvio Heck (ministro da Marinha) -, que imediatamente declararam estado de sítio para evitar qualquer manifestação pública. Ao mesmo tempo, passaram a controlar a imprensa e o rádio, intervieram nos sindicatos e prenderam seus opositores, incluindo deputados e até o general Lott - este último acusado de "subversivo" pelo ministra da Guerra.
Toda essa movimentação tinha uma finalidade: impedir a posse de Jango.
Entretanto, uma clara cisão militar surgiu no Rio Grande do Sul, onde o comandante do III Exército, general Machado Lopes, se declarou favorável ao cumprimento da Constituição, isto é, dar posse a Jango. Naturalmente, a atitude do general foi hostilizada de imediato pelo general Denys e por Lacerda, que lideravam a UDN no movimento antijanguista.
A prisão do general Machado Lopes foi cogitada. Mas como fazê-lo, se o Rio Grande do Sul era governado por Leonel Brizola, que entre outras coisas era cunhado de João Goulart? Brizola, aliás, deu ordens de defender a Constituição e preparar o Rio Grande do Sul contra tentativas de invasão.

  • O encaminhamento da solução

Enquanto as divergências se radicalizavam de parte a parte, na iminência de uma guerra civil, os Estados Unidos, temendo que o exemplo cubano se repetisse no Brasil, alteraram sua tática antijanguista e passaram a pressionar o general Denys e seus aliados para uma solução de compromisso. Aliás, ao que parece, mesmo João Goulart não estava interessado em liderar a revolta armada que os gaúchos julgavam próxima. A razão era bem simples: Jango era um fazendeiro m' milionário, em cujas terras criava-se um dos melhores gados do Brasil; por isso, não lhe interessava uma revolução que alterasse o regime de propriedade ou simplesmente desorganizasse a economia nacional. Tanto assim que, conciliatoriamente, aceitou as condições que lhe impuseram para assumir o poder.
A solução de compromisso foi iniciativa do deputado federal Plínio Salgado - ex-chefe integralista -, que apresentou ao Congresso uma emenda constitucional estabelecendo o regime parlamentarista no Brasil. Desse modo, João Goulart seria chefe de Estado, mas com poderes limitados. A emenda foi aprovada pelo Congresso "sob pressão m' militar", declarou Kubitschek, ex-presidente e naquele momento senador da República. Assim, a 7 de setembro de 1961, João Goulart prestou juramento como o novo presidente da República.
A intensa hostilidade de que se cercou a posse de Jango já denunciava o grande desgaste do "populismo”. Durante o governo de João Goulart, esse desgaste atingiu o seu auge: em 1964, através de um movimento militar, o presidente foi deposto, encerrando-se a era do populismo.

República Populista

Jânio da Silva Quadros (31/1/1961-25/8/1961)

  • Jânio, o "antipolítico"

Segundo o historiador norte-americano Thomas Skidmore, um conhecido “brazlianist”, Jânio era um "corpo estanho por excelência" no cenário político da época. Ainda segundo o mesmo autor, Jânio "apresentava-se como um candidato dinâmico de grande presença, que estimulava o público levando-o a confiar nele. Oferecia, assim, ao cidadão comum do eleitorado urbano a presença de uma transformação radical através da força redentora de uma única personalidade líder". Juntamente com Getúlio, Jânio foi um dos maiores lideres carismáticos do Brasil. Embora de início não estivesse totalmente identificado com o getulismo, posteriormente, após sua renúncia, repetiria, com freqüência, que de Getúlio tiraram a vida, mas não os ideais, ao passo que dele haviam tirado o ideal, e não a vida, estabelecendo assim uma significativa analogia.

  • O "estilo" de Jânio

Todavia, apesar da "excentricidade" aparente, Jânio era um político bastante conservador e autoritário. Desde o início, procurou controlar os sindicatos, não hesitou em reprimir os protestos camponeses do nordeste, mandou prender estudantes rebeldes, adotou uma política de austeridade e acreditou poder corrigir os vícios da administração pública reprimindo a corrupção. Apesar de sua estreita concepção política no plano interno, Jânio curiosamente declarou-se favorável a uma política externa independente, colocando-a em prática. Reatou as relações diplomáticas e comerciais com o bloco comunista, o que desagradou profundamente ao governo norte-americano.
Entretanto, os problemas que Jânio tinha a resolver eram muitos e difíceis. Em primeiro lugar, a pesada herança das contas legadas por Juscelino, referentes à construção de Brasília. De outro lado, não se mostrava capaz de superar a crise financeira, pois a sua política de austeridade era constituída de medidas impopulares, como congelamento dos salários, restrição ao crédito, corte de subsídios federais, desvalorização do cruzeiro. Com isso, as inquietações empresariais e operárias não tardaram a aparecer.
À falta de solução para os problemas internos acrescentaram-se os externos: "em agosto de 1961", narra um jornalista norte-americano, "Quadros manda ao Congresso seu projeto sobre lucros, que determina um novo imposto sobre todos os lucros, nacionais ou estrangeiros, de 30% - com uma condição importante: os lucros reinvestidos nas indústrias que beneficiavam o serviço público, ou a criação de novas indústrias, especialmente no Nordeste, seriam taxados em apenas 10%. Como já existe uma taxa de 20% sobre todos os lucros exportados, nossas companhias que mandam seus lucros para os Estados Unidos, ou as companhias locais que investem seus lucros no exterior, sofrem, portanto, uma taxa de 50%, ainda inferior às taxas nos Estados Unidos". Em suma, Jânio queria, através de medidas tributárias, bloquear, em parte, a acumulação de capitais e a remessa de lucros, ferindo os interesses do imperialismo e da classe dominante no Brasil.

  • A renúncia

Isso foi suficiente para que uma tempestade desabasse sobre o governo de Jânio, na forma de sistemática campanha da oposição por intermédio da imprensa. O pretexto para intensificar essa campanha foi dado pelo próprio presidente, ao agraciar Ernesto "Che" Guevara, que retornando da primeira conferência de Punta del Este (Uruguai) passara pelo Brasil. Ora, Guevara, ao lado de Fidel Castro, era a figura mais conhecida da revolução cubana de 1959, e nesse período Cuba já havia tomado, decididamente, o caminho do socialismo. Bastou esse novo gesto de Quadros - insignificante em si, pois a condecoração era mero protocolo - para que a oposição buscasse identificar o governo de Jânio com o comunismo. O ponto culminante da campanha antijanista foi a denúncia de Carlos Lacerda, então governador do estado da Guanabara, através de uma rede nacional de televisão, acusando-o de estar tramando para o Brasil um regime análogo ao de Cuba. No dia seguinte (2 5 de agosto de 1961), segundo algumas versões, o general Cordeiro de Farias, comandante-chefe do Exército, teria exigido que Jânio mudasse sua política externa, ao que ele teria replicado:

- O senhor está preso!

- E o senhor está deposto! - teria respondido Cordeiro de Farias.

Segundo a versão que se popularizou, diante das oposições acirradas, Jânio, irritado, teria simplesmente renunciado, com esperanças de ser recolocado no poder pelo povo, a fim de estabelecer, talvez, um governo forte, centrado na sua autoridade pessoal. Na carta renúncia (25 de agosto de 1961), Jânio acusou as "forças terríveis que se levantaram contra mim", levando ao fracasso seu plano de governo. Essas "forças ocultas", ele jamais chegou a nomear com total clareza. Seguramente, referia-se aos representantes do imperialismo norte-americano: John Moors Cabot (ex-embaixador), Adolf Berle e o secretário do Tesouro americano, Douglas Dillon, além de Herbert Dittman, embaixador da Alemanha Ocidental. Internamente, tratava se das forças antipopulistas aglutinadas na UDN, notadamente Carlos Lacerda.

República Populista

Juscelino Kubitschek (1956-1961)

  • Plano de Metas: o desenvolvimentismo

O governo Juscelino Kubitschek foi marcado por transformações de grande alcance, sobretudo na área econômica. Enfatizando o "desenvolvimento econômico industrial", estabeleceu, através do Plano de Metas, 31 metas, entre as quais energia, transporte, alimentação, indústria de base, educação e construção da nova capital, considerada “a 44 síntese de todas as metas”.
Essa "política desenvolvimentista" do governo Kubitschek baseava-se na utilização do Estado como instrumento coordenador do desenvolvimento, estimulando o empresariado nacional, e também criando um clima favorável à entrada do capital estrangeiro, quer na forma de empréstimos, quer na forma de investimento direto. Assim, em 1959, o governo criou a Sudene (Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste), para auxiliar o nordeste e integrá-lo economicamente ao mercado nacional. Talvez a mais significativa das medidas tenha sido a criação do Grupo de Estudos da Indústria Automobilística (GEIA), constituindo aquilo que seria, no futuro, o carro-chefe da industrialização brasileira, apesar de todas as distorções econômicas verificadas posteriormente.
Esse ambicioso programa de desenvolvimento econômico levou Juscelino a repensar o sistema americano, resultando na criação da Operação Pan Americana (OPA), que redefiniu as relações da América Latina com os Estados Unidos. Através dessa iniciativa, Juscelino procurou transformar a solidariedade pan-americana numa aliança entre os países, visando a superação do subdesenvolvimento.

  • As transformações

Sem dúvida, o esforço juscelinista acarretou a alteração da fisionomia econômica do país. A euforia desenvolvimentista não era, de fato, carente de fundamento. As indústrias se desenvolveram sensivelmente e a economia se diversificou. Todavia, com o modelo de desenvolvimento econômico concebido e executado, outros problemas apareceram. A abertura para o capital estrangeiro, que se tornou a principal alavanca do desenvolvimento industrial, começou a pressionar a economia, provocando a inflação. Apesar da criação da Sudene, o esforço para anular as disparidades econômico-regionais não teve saldo positivo. Ao contrário, o centro-sul desenvolveu-se aceleradamente, agravando ainda mais aquelas disparidades. Com isso, a transferência da mão-de-obra das áreas tradicionais para o centro-sul, isto é, do campo para a cidade, modificou a composição social dos grandes centros urbanos, aumentando a pobreza. Novos desequilíbrios se anunciavam, desdobrando-se nos anos seguintes em graves crises que culminariam com o movimento militar de 1964.

  • O imperialismo

Uma das dimensões, talvez a mais importante, do estilo desenvolvimentista do período de Juscelino foi o pleno enquadramento do Brasil nas novas exigências do capitalismo internacional, que tinha os Estados Unidos como centro hegemônico. De fato, o Brasil ajustou-se nesse período à linha mestra do capitalismo de organização - o capitalismo das multinacionais -, que modificou o caráter da dominação imperialista. Em vez da exportação de capitais - fórmula típica do capitalismo monopolista que surgiu nos anos 70 do século passado -, a ação do capitalismo avançado se deu pela implantação direta de indústrias, de unidades produtivas. Com isso, iniciava-se a internacionalização do mercado brasileiro, aprofundando a dependência econômica do país.

  • As eleições presidenciais de 1960

Nas eleições de 1960 concorreram Jânio da Silva Quadros, apoiado pela UDN, e Henrique Lott, através da coligação PTB, PSD e PSB. A emergência de Jânio Quadros e o amplo apoio popular com que contou ofereceram aos setores da oposição, agrupados na UDN, a mais excelente perspectiva para quebrar a hegemonia PSD-PTB, herdeira do getulismo. A vitória janista foi verdadeiramente impressionante, com uma diferença de mais de 1 milhão de votos (5 636 623 contra 3 846 825).

República Populista

Getúlio Vargas (1951-1954)

  • O nacionalismo

O novo governo de Vargas realizou-se no momento em que os países capitalistas se reorganizavam, tendo como centro os Estados Unidos. Desse modo, o processo de industrialização, que havia sido facilitado pela Segunda Guerra, foi anulado, pois o imperialismo retomou seu vigor e a reconquista do mercado brasileiro foi empreendida. Todavia, a política econômica de Vargas era marcadamente nacionalista, chocando-se por isso com os interesses imperialistas, sobretudo os norte-americanos. A mais significativa decisão de Vargas no período foi a nacionalização do petróleo, com a criação da Petrobrás, através da lei 2 004 de 3 de outubro de 1953, que estabeleceu o monopólio estatal do petróleo. Naturalmente, o nacionalismo de Vargas não agradava aos capitalistas norte-americanos, e o presidente dos Estados Unidos, Eisenhower, cancelou unilateralmente o acordo de desenvolvimento entre o Brasil e os Estados Unidos, entregando apenas 180 milhões de dólares dos quase 400 milhões prometidos anteriormente.

  • O reforço do sindicalismo

Paralelamente à política econômica nacionalista, Getúlio concedeu especial atenção ao movimento trabalhista, procurando apoiar-se na grande massa popular para sustentar o seu programa econômico. As oposições cresceram com a nomeação de João Goulart como ministro do Trabalho, em princípios de 1953. O novo ministro reorganizou os sindicatos de modo a dar ao governo maiores condições de manipular a massa operária.

  • As oposições

Como era de esperar, Vargas teve de enfrentar a oposição dos conservadores, cada vez mais violenta com a participação de Carlos Lacerda, proprietário do jornal Tribuna da Imprensa. Na campanha antigetulista, Lacerda não hesitou em explorar mesquinhamente a vida privada do presidente e dos seus assessores. Além disso, procurou identificar o novo governo de Getúlio com o retorno ao Estado Novo. De outro lado, as pressões norte-americanas, sobretudo das empresas petrolíferas, criavam dificuldades cada vez maiores para Vargas. A luta chegou ao auge em meados de 1954, quando o jornalista Carlos Lacerda sofreu um atentado. Embora Lacerda tenha escapado, o atentado resultou na morte de um oficial da Aeronáutica, major Rubens Vaz. O envolvimento de pessoas que compunham a segurança pessoal de Vargas fez com que o Exército se colocasse contra o presidente, exigindo a sua renúncia. Na manhã de 24 de agosto de 1954, depois de escrever uma carta-testamento, Getúlio se suicidou.




De Getúlio a Juscelino

Nos dezesseis meses que se seguiram ao suicídio de Vargas três presidentes se sucederam: o vice-presidente Café Filho, que assumiu o poder mas, por motivos de saúde, imediatamente deixou o cargo; o presidente da Câmara dos Deputados, Carlos Luz, que pouco depois foi interditado pelo Congresso Nacional (11 de novembro de 1955); e finalmente Nereu Ramos, vice-presidente do Senado, que se manteve na presidência até 31 de janeiro de 1956.
Nas eleições presidenciais de 1956 foi eleito, novamente pelas forças getulistas, Juscelino Kubitschek de Oliveira, apoiado pelo PSD e pelo PTB. Derrotadas, as forças antigetulistas - notadamente a UDN - reagiram à ascensão de Juscelino e tentaram impedir a sua posse, que foi garantida pelo "golpe preventivo" do general Henrique Teixeira Lott, então ministro da Guerra.

República Populista

Eurico Gaspar Dutra (1946-1951)

  • A Constituição de 1946

Durante a sua presidência foi eleita a Assembléia Constituinte que, em 18 de setembro de 1946, deu origem à quarta Constituição republicana, a quinta do Brasil. Embora tenha mantido a federação e o presidencialismo, a nova. Constituição, como a de 1934, fugiu bastante às linhas doutrinárias de 1891.
Para controlar o Executivo, determinou o comparecimento compulsório dos ministros ao Congresso, quando convocados, para informações e interpelações, tornando-os responsáveis pelos atos que referendassem; previu, ainda, a formação de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI’s), segundo o modelo norte-americano.
Além disso, a nomeação dos ministros não acarretaria a perda dos mandatos legislativos que exercessem, e o período presidencial duraria cinco anos.
Cumpre acrescentar que os direitos trabalhistas do período getulista foram incorporados ao texto constitucional.

  • Reflexos da guerra fria

No plano internacional a presidência de Dutra inseriu-se nos quadros da guerra fria, caracterizada a partir de 1947 com a Doutrina Truman. Integrado como estava na área de influência norte-americana, o Brasil definiu-se no plano da política externa como aliado da grande potência do Norte. O ingresso oficial do Brasil no cenário da guerra fria aconteceu com o tratado de assistência mútua, em setembro de 1947, entre Brasil e Estados Unidos. Além disso, na IX Conferência Interamericana, realizada em Bogotá, o Brasil associou-se ao sistema de segurança do hemisfério ocidental atlântico.
Segundo a nova norma das relações internacionais que o Brasil assumiu, Dutra coerentemente rompeu relações diplomáticas com a União Soviética, ao mesmo tempo em que o Partido Comunista do Brasil, chefiado por Luís Carlos Prestes, foi declarado ilegal.

  • A sucessão presidencial
Na disputa pela sucessão de Dutra concorreram quatro candidatos: novamente Eduardo Gomes (UDN), João Mangabeira pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), Cristiano Machado (PSD) e Getúlio Vargas, apoiado pelo PTB, pelo PSP (Partido Social Progressista) e pela facção dissidente do próprio PSD. Venceu Getúlio Vargas.

República Populista

José Linhares (29/10/1945-31/1/1946)

  • As eleições de 2 de dezembro
Com a queda de Getúlio Vargas, a presidência passou a ser ocupada por José Linhares, presidente do Supremo Tribunal Federal. No período em que ficou no poder foram realizadas as eleições presidenciais. Concorreram Eurico Gaspar Dutra, apoiado pela coligação PSD-PTB, Eduardo Gomes (UDN), Yedo Fiúza (PCB) e ainda Rolim Teles (Partido Agrário). Saiu vitoriosa a candidatura do general Dutra, por ampla maioria.

A Redemocratização de 1946 (Estado Novo)

  • As duas fases da redemocratização

O processo de redemocratização comportou pelo menos duas etapas distintas: a primeira vai de outubro de 1943, data do Manifesto dos Mineiros, até 29 de outubro de 1945; a segunda começa com a presidência transitória de Linhares (29 de outubro de 1945 a 1° de fevereiro de 1946) e vai até setembro de 1946, com o encerramento dos trabalhos da Constituinte. A primeira fase correspondeu às agitações democráticas que culminaram com a queda de Vargas. A segunda - que Weffort considera "a fase da colheita" - correspondeu à reorganização do país segundo as determinações da fase anterior.

  • A vitória aparente da UDN

Com o golpe de 9 de outubro de 1945 e a deposição de Vargas, a UDN aparentemente tinha saído vitoriosa. Visto mais de perto, o golpe desencadeado pela UDN limitou-se à mera conspiração, com caráter palaciano, sem o concurso da mobilização popular. De modo que a derrubada de Vargas não teve, como se esperava, a devida repercussão política e popular. Ao contrário, a forma como Getúlio caiu fez com que ele aparecesse, aos olhos da opinião pública, como vítima do "partido dos ricos". O prestígio do ditador não diminuiu e, inversamente ao que se poderia supor, o "queremismo" não fora motivado apenas por forças oficiais. Surpreendentemente, a popularidade de Getúlio, "pai dos pobres", mostrou-se bem acima das expectativas criadas nas eleições presidenciais que levaram o general Dutra ao poder.

  • O PCB

O PCB, por sua vez, manteve-se dentro da orientação anterior à queda de Vargas. Para preservar a "frente" e a aliança com as "forças progressistas", ofereceu apoio a Linhares e, posteriormente, a Dutra.Afastou-se de Getúlio, acusando-o de ter traído o povo. Estranhamente, a esquerda tinha como linha política apoiar sempre a situação, evitando - parece - a qualquer custo passar para a oposição.

  • A persistência do Estado Novo
A redemocratização ambicionada por toda a oposição antigetulista estava limitada desde o início, pois as forças políticas em jogo tinham sido formadas no seio do Estado Novo e não se haviam libertado do passado recente. Basta referir aqui o fato de o próprio Dutra ter sido ministro da Guerra de Getúlio. Dutra dependia de Vargas, uma vez que não podia governar senão com o apoio dos grandes partidos (PSD e PTB) formados por Getúlio no fim do Estado Novo.
A persistência do Estado Novo foi favorecida ainda pela emergência do movimento operário, que retomou seu vigor no princípio do ano de 1946, sem, todavia encontrar ressonância nos partidos políticos organizados. Estes não possuíam a sabedoria de compreender que a verdadeira democracia tinha que passar pelo teste da incorporação das forças operárias. A cisão entre as elites políticas e a massa popular facilitou a adoção de medidas repressivas, próprias do Estado Novo: intervenções nos sindicatos, dispositivos legais que permitiam o controle e a repressão do operariado. Mesmo o PCB não soube canalizar as forças operárias, pois era adepto da "ordem e tranqüilidade" e estava aquém da proposta do operariado.
A alteração da conjuntura das relações internacionais, logo após o término da Segunda Guerra Mundial, também contribuiu para a manutenção de traços do Estado Novo. Com efeito, depois da derrota do nazi-fascismo, o declínio da Europa - antes, o centro hegemônico mundial - era evidente. O eixo das relações internacionais deslocou-se para as duas superpotências em ascensão: Estados Unidos e União Soviética. A relação bipolar que se impôs daria origem ao principal fenômeno do pós-guerra: a guerra fria.

A Queda do Estado Novo (Estado Novo)

  • Reflexos políticos da Segunda Guerra

A partir de 1942, quando a posição do Brasil se definiu claramente a favor das potências liberais, o engajamento no grande conflito não pôde deixar de repercutir na conjuntura política interna. Como resolver a contradição de um Estado inspirado no fascismo italiano que se empenhara na luta antifascista, em defesa dos ideais antiautoritários.

  • A crise interna

É claro que as repercussões da Segunda Guerra, por si sós, não explicam a transformação política no Brasil. Na verdade, elas se entrelaçaram à crise política interna, formando uma complexa rede de contradições que resultou na criação de conjunturas favoráveis ao desmantelamento do Estado Novo.
Em 1943, esgotou-se o limite que o Estado Novo impusera “para a legitimação, por meio de um plebiscito, da Constituição outorgada em 1937”. Nessa conjuntura surgiu o Manifesto dos Mineiros (outubro de 1943), assinado por Virgílio de Melo Franco, Afonso Arinos, Milton Campos, Magalhães Pinto, Adauto Lúcio Cardoso, Odilon Braga, Pedro Aleixo e Bilac Pinto, futuros líderes da União Democrática Nacional (UDN). O citado documento, reconhecendo "que o Brasil está em fase de progresso material e tem sabido mobilizar muitas das suas riquezas naturais, aproveitando inteligentemente as realizações do passado e as eventualidades favoráveis do presente", criticava a "ilusória tranqüilidade e a paz superficial que se obtêm pelo banimento das atividades cívicas, [que] podem parecer propícias aos negócios e ao comércio, ao ganho e à própria prosperidade, mas nunca benéficas ao revigoramento dos povos”. Em síntese, o manifesto exigia a participação política dos agentes do progresso econômico, isto é, um desenvolvimento político correspondente e compatível com a prosperidade material.

  • A vitória dos Aliados

A crise interna acompanhou o progressivo avanço dos Aliados na Segunda Guerra. E, aliás, a coincidência desse avanço com as etapas de redemocratização no Brasil, como afirma Weffort, “não é simples fruto do acaso”. O próprio Vargas, sentindo o comprometimento de seu poder, assumiu, ambiguamente, uma posição mais flexível. No seu discurso de novembro de 1943 declarou: “Quando terminar a guerra, em ambiente próprio de paz e ordem, com as garantias máximas à liberdade de opinião, reajustaremos a estrutura política da nação, faremos de forma ampla e segura as necessárias consultas ao povo brasileiro”.
Apesar dessa declaração, as forças de oposição que estavam emergindo não acolheram com entusiasmo a promessa de Vargas. Em 1945, quando a guerra chegou ao fim, essas forças se manifestaram, levando o Estado Novo à inelutável desagregação.

  • As agitações

As agitações pela redemocratização iniciaram-se com o I Congresso Brasileiro de Escritores, em janeiro de 1945, que se manifestou favoravelmente ao restabelecimento da democracia. As declarações de José Américo de Almeida, no jornal Correio da Manhã, tiveram um grande impacto. Francisco Weffort assim vê o momento: "Da parte do governo há o ato adicional prometendo a realização de eleições para o dia 2 de dezembro. Quase ao mesmo tempo rompe-se o dique da censura à imprensa. Logo depois, aparece a candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes, articulada pela oposição liberal, que, por sua vez, passa a constituir-se em partido: União Democrática Nacional (UDN). E em março surge a candidatura do general Enrico Dutra, que fora ministro da Guerra do Estado Novo. À sua volta articulavam-se as forças governistas, que logo dariam origem ao Partido Social Democrático (PSD); a segunda agrupação governista deveria surgir depois e para aderir igualmente à candidatura de Dutra" 9.
A descompressão da vida política promoveu a formação de agremiações partidárias que exprimiam os anseios até então represados. Para Lourdes Sola, o "Partido Social Democrático, que tinha Dutra por candidato, era integrado pelas oligarquias rurais, por industriais e banqueiros habituados a negociações com o governo central" 1°. Todavia, esse partido não possuía unidade ideológica, embora controlasse uma poderosa máquina eleitoral.

  • O Partido Trabalhista Brasileiro (PTB)

Mobilizava a burocracia sindical ligada ao trabalhismo, sob a direção de seus criadores, Marcondes Filho, Hugo Borghi, e de seu principal ideólogo, Alberto Pasqualini. O governo procurava organizar assim, agora sob forma partidária, um dos outros pólos em que se baseara seu prestígio, as camadas populares urbanas, que passaram a representar um conjunto significativo de votos. A ideologia populista desse partido mantinha e reforçava a tradição inaugurada por Vargas.

  • A União Democrática Nacional (UDN)

Ainda segundo a autora, fundada em 1944, a UDN reunia os elementos antigetulistas: antigos liberais constitucionais como Armando Sales, Júlio de Mesquita Filho, proprietários de uma cadeia de jornais como Assis Chateaubriand, o dono do Correio da Manhã, Paulo Bittencourt, e a burguesia comercial urbana, ligada aos interesses exportadores e importadores, prejudicados em seus lucros pelo intervencionismo econômico do Estado Novo. Contava também com a adesão das classes médias urbanas, assustadas com a retomada do processo inflacionário, que se acentuara a partir de 1942. A ideologia da UDN, politicamente liberal, no plano econômico se manifestava também liberal, reivindicando a liquidação do protecionismo, identificado como causa principal do aumento dos preços. Isso conquistava a simpatia daquelas camadas médias, cujas perspectivas econômicas se orientavam pelo ponto de vista do consumidor. Uma ala da UDN, a Esquerda Democrática, mais tarde se desdobraria numa nova organização, o Partido Socialista Brasileiro (PSB).

  • A Anistia

Diante das pressões crescentes da opinião pública, Getúlio decretou anistia aos presos políticos, inclusive ao líder comunista Luís Carlos Prestes, que estava preso desde 1936, com o fracasso da intentona comunista de 1935. Depois de nove anos na prisão do Estado Novo, Prestes voltou a atuar, organizando no dia 23 de maio de 1945 uma gigantesca manifestação popular no Rio de Janeiro. Curiosamente, nessa manifestação, o Partido Comunista, legalizado desde maio, expressou seu apoio ao governo de Getúlio. Apesar de estranha, tal atitude do PCB estava de acordo com sua linha política, baseada no antiiperialismo e na aliança com as forças progressistas nacionais. Além disso, o apoio a Getúlio expressava também a presença da diretriz, fixada pela União Soviética, de formação de uma frente popular nos países que lutaram contra o Eixo.

  • O queremismo

No segundo semestre de 1945, a tônica das movimentações políticas mudou a ênfase. Até o primeiro semestre do mesmo ano, a campanha eleitoral absorvera as energias políticas. A partir do semestre seguinte, a tônica recaiu sobre a questão da Constituinte, que deveria reunir-se somente depois da eleição presidencial, marcada para 2 de dezembro daquele ano. Foi quando se expandiu a pregação do "queremismo" (" Queremos Getúlio"), orientada pelos trabalhistas e apoiada pelos comunistas. Vargas discretamente alimentou esses movimentos populares urbanos, propondo a "lei malaia" (junho de 1945), como ficou conhecida a lei antitruste, que tinha um caráter nitidamente nacionalista e antiimperialista.

  • A queda de Vargas

O queremismo representou, portanto, o respaldo - ainda que indefinido - de que Getúlio necessitava para continuar no poder. E isso despertou na UDN uma desconfiança extrema a qualquer ação de Getúlio. A situação se tornou mais clara a partir de agosto de 1945, quando a manobra continuísta se evidenciou com a evolução do queremismo para o grito de "Constituinte com Getúlio”. Isso veio inquietar a oposição udenista, pois a Constituinte antes das eleições presidenciais significaria a preservação do poder nas mãos de Vargas, segundo Weffort, "pelo menos até o momento em que estivesse estabelecida uma nova ordem institucional, assegurando-se a possibilidade de uma influência decisiva sobre a sua elaboração" 13. No início do mês de outubro, o Partido Comunista estava inteiramente disposto a apoiar Vargas. Mas "é precisamente nesse momento, em que as forças getulistas e seus aliados estão no máximo de sua capacidade de ação, que se desencadeia o Golpe de Estado" 14. Um grande comício pró -getulista, marcado para o dia 27, foi proibido pelo chefe de policia do Distrito Federal. Getúlio reagiu, substituindo-o pelo seu irmão, Benjamim Vargas. Contudo, a derradeira manobra encontrou forte resistência em Góis Monteiro. Dois dias depois, em 29 de outubro de 1945, Getúlio foi obrigado a abandonar o poder, transmitindo-o ao Judiciário. Terminou aí o Estado Novo.

O Brasil na Conjuntura da Segunda Guerra Mundial (Estado Novo)

  • As indecisões

Embora identificado com os regimes totalitários europeus, o Estado Novo getulista conservava-se neutro em relação ao conflito que eclodira em 1939, entre os Estados liberais e o nazi-fascismo europeus.
Apesar das pressões norte-americanas, o governo continuava indeciso. E essa indecisão era reflexo das tendências contraditórias dos homens do governo: enquanto Filinto Müller, chefe da polícia do Rio, e Francisco Campos eram favoráveis às potências fascistas do eixo Berlim-Roma-Tóquio, Osvaldo Aranha colocava-se contra. Entre as duas tendências oscilavam os generais Góis Monteiro e Dutra.

  • O rompimento com o Eixo

A inclinação a favor das potências aliadas deu-se a partir do sucesso das negociações de empréstimos entre o Brasil e o Eximbank, em 1941. Já na II Conferência de Consulta dos Chanceleres no Rio de janeiro, em meados de janeiro de 1942, a aliança política entre Brasil e Estados Unidos foi efetivada. Tornou-se inevitável o rompimento das relações diplomáticas com o Eixo. Em março do mesmo ano, o comprometimento do Brasil se aprofundou, com a assinatura de um acordo que permitia aos Estados Unidos a utilização das costas nordestinas como bases aeronavais.

  • A entrada do Brasil na guerra

A participação direta do Brasil no conflito mundial aconteceu após repetidos ataques aos navios brasileiros por parte da força submarina alemã. Cerca de dezoito navios foram perdidos nesses ataques, realizados até em águas brasileiras. Além das perdas materiais, 607 brasileiros foram mortos.
Evidentemente, isso provocou reações espontâneas que resultaram em manifestações populares exigindo a entrada do Brasil na guerra. Em 21 de agosto de 1942, finalmente, Osvaldo Aranha, ministro das Relações Exteriores, declarou oficialmente guerra contra a Itália e a Alemanha.
A participação do Brasil limitou-se de início ao fornecimento de matérias-primas estratégicas e ao auxílio no policiamento do Atlântico Sul. Somente em 1944 foi enviado à Itália um contingente de 23 334 soldados, que formaram a Força Expedicionária Brasileira (FEB), sob o comando do general Mascarenhas de Morais. Na Itália, incorporada ao 5°. Exército norte-americano - chefiado pelo general Clark -, a FEB obteve algumas vitórias contra as tropas fascistas, destacando-se as batalhas de Monte Castelo e Montese.
No entanto, o triunfo das forças democráticas do mundo contra a barbárie fascista pôs o Estado Novo em posição extremamente incômoda. No dia seguinte ao final da guerra, a ditadura de Vargas já não tinha lugar, pois havia sido ultrapassada pelos acontecimentos.

O Desenvolvimento Industrial (Novo Estado)

  • As inovações de Vargas

Já nos referimos anteriormente à relação existente entre a economia cafeeira e a industrialização. Na verdade, a industrialização no Brasil começou sem apoio decidido do Estado, sem uma clara política voltada para ela. Na era de Vargas, esse reforço finalmente apareceu, e as realizações efetivamente inovadoras tomaram forma.
Um plano qüinqüenal, elaborado em 1939 por iniciativa de Vargas e seu ministro da Fazenda, Sousa Costa, tinha como meta "uma usina de aço, fábrica de aviões, usinas hidrelétricas em Paulo Afonso, drenagem do rio São Francisco, estrada de ferro e de rodagem e a compra na Alemanha de navios para o Lloyd Brasileiro, de destróieres e aviões". Apenas parte desse plano foi levada a cabo, mas a importância para a vida nacional das inovações efetivadas não foi pequena.
Ora, a inovação mais importante consistiu “em um novo tipo de interferência do Estado, em nível da economia. Até então, ele organizara e centralizara, intensificando os processos econômicos já existentes: na agricultura, estimulando a diversificação da produção e suportando, em nível mais oneroso do que se fizera na República Velha, os preços do café; na indústria, concedendo facilidades de financiamento, de créditos a juros baixos através do Banco do Brasil. Agora, através da instalação de novas indústrias, estatais, o Estado assumia o papel de principal investidor. Criavam-se também, com isso, as bases institucionais de que emergiria uma nova espécie de grupo burocrático - composta de militares e civis, bem mais duradoura do que o próprio regime de Vargas, e que proliferaria nos anos 50 -, uma” burocracia industrial “, amplamente remunerada e prestigiada. Surgia um novo agente econômico (e político), o ‘tecnocrata”.
“Além disso, esses investimentos tinham uma significação intrínseca: em sua maioria canalizados para a indústria pesada, setor pouco atraente para os investidores particulares, em que a remuneração do capital se faz a longo prazo, resultaram na instauração das condições infra-estruturais para o desenvolvimento do capitalismo no Brasil”.

  • Os efeitos da Segunda Guerra (1939-1945)

A eclosão da Segunda Guerra Mundial (19391945) teve efeitos favoráveis à política de industrialização em curso no Brasil, pois, "além de passarem a ter o mercado interno a seu inteiro dispor, muitas indústrias brasileiras viram-se chamadas a preencher o vácuo deixado, em outros países, pela perda de contato com os seus fornecedores tradicionais de produtos manufaturados. Assim, a exportação de tais artigos tornou-se, pela primeira vez, um item ponderável na pauta exportadora do país".
Conseqüentemente, os industriais, sobretudo do Rio de Janeiro e de São Paulo, puderam ampliar suas funções. O Estado encarregou-se de criar a infra-estrutura necessária. Através de empréstimos do Eximbank (banco semi-oficial norte-americano), Vargas obteve o empréstimo desejado para construir a Usina de Volta Redonda (1941). Os meios de transporte para alimentar a usina foram viabilizados: incrementou-se o transporte marítimo para trazer o carvão do sul (Santa Catarina); equipou-se a estrada de ferro Central do Brasil para transportar o minério extraído em Minas Gerais, onde foi criada a Companhia do Vale do Rio Doce (1942).
De acordo com o mesmo espírito nacionalista que presidiu a formação da indústria pesada no Brasil, o Estado interveio na formação do Conselho Nacional do Petróleo (1938), a fim de controlar o refinamento e a distribuição do combustível, essencial para assegurar o desenvolvimento dos transportes.

  • A aviação

A aviação comercial no Brasil começou em 1925, com a instalação de uma linha aérea francesa ligando Rio de Janeiro e Buenos Aires. Em Porto Alegre, foi fundada a Viação Aérea Rio-Grandense (Varig). Outras companhias apareceram, como a Cia. Sindicator Condor (1927), futura Cruzeiro do Sul, e a Nyrba do Brasil (1928), futura Panair do Brasil.

  • Contradições do Estado Novo

Desde a Primeira Guerra (1914-1918), passando pela crise de 1929 até a Segunda Guerra (1939-1945), havia no Brasil uma conjuntura favorável à industrialização, que, não obstante, se efetivou associada à economia cafeeira e não em oposição a ela. Na realidade, os capitais investidos nas indústrias eram provenientes da acumulação no setor agrícola, donde se conclui que a exploração da grande massa rural era a chave daquela acumulação. Por isso, apesar de sua aparência antioligárquica, o Estado Novo manteve intocado o sistema de dominação no campo. Daí, para Lourdes Sola, "as características contraditórias do Estado Novo, combinando aspectos progressistas, como o impulso à industrialização, e conservadores, como a repressão aos movimentos de coerção apoiado nos grupos militares(...)”. Tomado em conjunto, na era de Vargas, particularmente no período do Estado Novo, o Estado funcionou, efetivamente, como o mais poderoso instrumento de promoção da acumulação de capitais, colocando o Brasil nos trilhos do capitalismo. À medida que o Estado autoritário getulista criou condições para o deslanche da industrialização, inevitavelmente criou também condições para a ampliação do debate em torno da forma do desenvolvimento. A burguesia passou a exigir uma participação maior nas decisões, e isso implicava a passagem do Estado para o segundo plano, apagando sua pesada e incômoda presença no campo econômico. Em outros termos, o Estado Novo foi "adequado" para promover a "acumulação primitiva" de capital. Uma vez cumprida essa etapa, a própria forma do Estado passou a ser obstáculo a superar, e a "redemocratização" tornou-se o caminho inevitável, selando o destino de Vargas.

As Transformações Econômicas (Estado Novo)

  • O fortalecimento do mercado interno

Até os fins da República Velha, o Brasil não havia superado de todo a pesada herança colonial. Continuava um país monocultor (café) e estritamente dependente do mercado externo. Porém, desde a abolição da escravatura, esse esquema econômico estava condenado, por causa da generalização do trabalho assalariado. Em muito contribuiu, ainda, a maciça imigração estrangeira. Dessa maneira, com o aumento da mão-de-obra livre e assalariada, criou-se necessariamente um mercado interno.
Essa transformação estava relacionada com o desenvolvimento do capitalismo: ao ampliar o seu potencial produtivo, a Europa passou a necessitar de um mercado cada vez maior. Foi o que determinou no Brasil, segundo Caio Prado Jr., a emergência do "fator consumo, praticamente imponderável no conjunto do sistema anterior, em que prevalece o elemento produção".

  • A crise do modelo agrário-exportador

Evidentemente, num sistema voltado para a produção de bens primários - café, borracha, açúcar, algodão, cacau - e exclusivamente para fora, as crescentes necessidades do mercado interno tornaram-se um problema de difícil solução, pois a única saída era importar cada vez mais, o que acarretava um sério desequilíbrio na balança comercial.
A direção do desenvolvimento econômico começou então a mudar, com a crescente diversificação no que se refere à produção tanto de alimentos quanto de manufaturas.
Essa tendência à "nacionalização da economia" já era visível durante e após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), e com a crise de 1929 ela se intensificou, pois a política de valorização do café, que até então sustentava o modelo agrário-exportador, entrou em seu ciclo descendente. A falta de financiamento e o bloqueio às importações favoreceram o desenvolvimento industrial. A fisionomia econômica começou a se alterar profundamente.

  • A queima do café

A demonstração mais evidente da inadequação do modelo agrário-exportador brasileiro ao mercado internacional capitalista foi o beco sem saída em que se encontrava a política cafeeira. Mesmo após a ascensão de Vargas, procurou-se proteger o café com base na mesma política de valorização herdada da República Velha. Qual o resultado? Empréstimo externo, endividamento crescente e queima do café assim adquirido. O aumento extraordinário da dívida externa levou finalmente o governo ao seu congelamento, em 1938-39. Queimaram-se 78 milhões de sacas de café até 1944. O absurdo da situação, por si mesmo, indicou novos caminhos.
Na verdade, desde o Convênio de Taubaté (1906), a economia cafeeira havia entrado numa crise que se repetiria de forma permanente, como um círculo vicioso. O empréstimo externo para financiar e depois queimar e destruir a produção excedente, a fim de manter o preço e a lucratividade dos cafeicultores, estimulava a produção, tornando necessários novos empréstimos. Dessa forma, a situação foi se agravando cada vez mais, e a política de valorização apenas adiou a catástrofe final, que veio com a crise de 1929. Nesse contexto, o desenvolvimento industrial e a diversificação da economia eram um rumo "natural" a ser tomado.

Controle e Repressão (Estado Novo)

  • O DIP: Departamento de Imprensa e Propaganda

Para garantir o funcionamento do novo regime, foram criados vários instrumentos de controle e repressão. Inicialmente, destacou-se o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), encarregado do controle ideológico. Para tanto, exercia a censura total dos meios de comunicação - imprensa, rádio e cinema -, através dos quais, inoculando na sociedade o medo do "perigo comunista", sustentava o clima de insegurança que justificara o novo regime. Além disso, trabalhava na propaganda do presidente, formando dele uma imagem sempre favorável. Com esse fim foi instituída a Hora do Brasil, emissão radiofônica obrigatória. Naturalmente, a intolerância pela diversificação da informação era a base do novo regime. E qualquer oposição ideológica era duramente reprimida, a exemplo do confisco do jornal O Estado de S. Paulo, fundado por Júlio de Mesquita.

  • A Polícia Secreta

Ao mesmo tempo em que a repressão ideológica alargou seus horizontes através da oficialização, avultou o papel da Polícia Secreta, chefiada por F' Filinto Müller. Tal como nos regimes totalitários europeus, a Polícia Secreta se especializou em práticas violentas, reprimindo, com torturas e assassinatos, os indivíduos considerados nocivos à ordem pública.

  • O controle dos sindicatos

A preocupação do novo regime era neutralizar e anular a influência política do operariado, fazendo os trabalhadores ligarem-se aos sindicatos. O princípio norteador dessa política trabalhista foi a concepção corporativa do fascismo, que consistia na negação da luta de classes e na afirmação da colaboração entre elas. Esse princípio não reconhecia, portanto, as diferenças de interesses entre patrões e empregados, colocando acima das contradições de classe o suposto interesse, mais geral, da "nação”. Por isso, pela Constituição de 1937, as greves e o lockout foram proibidos, por serem "recursos anti-sociais, nocivos ao trabalho e ao capital, incompatíveis com os superiores interesses nacionais”.
A autonomia sindical foi finalmente liquidada com a instituição do Imposto Sindical, cobrado compulsória e anualmente de todos os trabalhadores e equivalente a um dia de trabalho.
Esse imposto - destinado a remunerar o pessoal encastelado no aparato burocrático sindical - era recolhido pelo Ministério do Trabalho, que então fazia a redistribuição entre os sindicatos. Assim, os sindicatos tornaram-se entidades dependentes do Estado e, portanto, facilmente manipuláveis por ele.
Uma das conseqüências para os sindicatos foi o surgimento dos "pelegos", trabalhadores que não representam autenticamente os interesses de sua classe; beneficiados pelo sistema sindical, identificavam-se com o governo.

A Constituição de 1937 (Estado Novo)

  • Características do novo regime

Apesar da inegável afinidade entre o novo regime, instituído pelo golpe de 1937, e o regime dos Estados fascistas europeus, certas características peculiares destes não apareceram na formação do Estado Novo. O golpe de 1937, segundo Locardes Sola, "não representou a vitória de um partido organizado (a participação dos integralistas era adjetiva), nem teve apoio ativo das massas". Careceu, por outro lado, de força e coerência ideológica. A instauração do Estado Novo foi - na opinião da mesma autora - "um golpe de elites político-militares contra elites político-econômicas”.
Nesse sentido, o decreto de 2 de dezembro de 1937, que dissolveu todos os partidos, é bem elucidativo. Comecemos com as razões do decreto. Segundo ele, os partidos políticos eram "artificiosas combinações de caráter jurídico e formal" e tinham "objetivos meramente eleitorais”. A crítica dirigia-se claramente aos partidos tradicionais herdados da República Velha - expressões dos interesses locais e incapazes, portanto, de formar a "nação”. Por isso no decreto se afirmou que os partidos não correspondiam "aos reais sentimentos do povo brasileiro", pois "não possuem conteúdo programático nacional”. Essa última denúncia não era aplicável, no entanto, à AIB e à ANL, pois ambas haviam superado os partidos até então existentes por trazerem "conteúdo programático nacional”. Entretanto, contra a AIB e a ANL, as acusações seriam outras: elas espelhavam ideologias e doutrinas contrárias aos postulados do novo regime. Assim, uma vez que todos os partidos eram inadequados, a instauração do novo regime foi a solução ideal, pois fora fundado em nome da nação para atender às suas aspirações e necessidades, devendo estar em contato direto com o povo.
Portanto, o pano de fundo da ideologia do Estado Novo foi o mito da nação e do povo, duas entidades abstratas que por si sós não significam absolutamente nada. Na realidade, esse foi o momento em que, através da ditadura, se procurou suprimir os localismos e viabilizar um projeto realmente nacional.
Identificando nação e povo, e ambos com o ditador, sem a distância interposta dos partidos, o Estado Novo tinha a ilusão de que finalmente o povo governaria a si próprio e a nação se reencontraria. O ditador era então a encarnação viva do povo e da nação.

  • A nova Constituição

A Carta Outorgada de 1937 teve como principal autor Francisco Campos e caracterizou-se pelo predomínio do poder Executivo, considerado o "órgão supremo do Estado", usurpando até as prerrogativas do Legislativo. O presidente foi definido como a "autoridade suprema do Estado, que coordena os órgãos representativos de grau superior, dirige a política interna e externa, promove ou orienta a política legislativa de interesse nacional e superintende a administração do País", conforme o texto constitucional. Passou a ter completo controle sobre os estados, podendo a qualquer tempo nomear interventores.
Instituiu-se ainda o estado de emergência, que permitia ao presidente suspender as imunidades parlamentares, prender, exilar e invadir domicílios; para completar, instaurou-se novamente a pena de morte e legalizou-se a censura para os meios de comunicação -- jornais, rádio e cinema.

- O mandato presidencial foi dilatado para seis anos.

- O poder Legislativo seria composto pelo presidente da República, pelo Conselho Nacional (que substituiu o Senado) e pelo Parlamento Nacional (Câmara dos Deputados).

- O Parlamento Nacional, com três a dez representantes por estado, seria eleito por voto indireto (vereadores das Câmaras Municipais e dez eleitores por voto direto).

- O Conselho Nacional seria composto por um representante de cada estado, eleito pelas

- Assembléias Estaduais, e por dez membros nomeados pelo presidente, com mandatos de seis anos.

Sob inspiração do Estado corporativo do regime fascista italiano, a nova Constituição criou o Conselho da Economia Nacional, composto pelos representantes da produção - indicados por associações profissionais e sindicatos reconhecidos por lei -, com representação paritária de empregados e sob a presidência de um ministro de Estado. O Conselho da Economia Nacional tinha a função de assessoria técnica, visando obter a colaboração das classes, a racionalização da economia e a promoção do desenvolvimento técnico. Tudo isso significava também que o Estado iria intervir e dirigir a economia nacional.
A Carta Outorgada de 1937 deveria ter sido submetida a um plebiscito*, como determinava o seu texto, mas o ditador fez por esquecer esse compromisso.

  • O DASP

Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP) foi criado em 1938 com a finalidade de dar ao Estado um aparato burocrático racionalizador da administração pública. Em suma, tratava-se de modernizar a burocracia.
Segundo Hélio de Alcântara Avellar, o DASP tinha a função de pôr fim ao "caráter político do recrutamento do funcionalismo, partindo do imperativo técnico da neutralidade do serviço e do servidor público".
Com o DASP, generalizou-se o sistema de mérito, isto é, o recrutamento passou a ser feito mediante a avaliação da capacidade, através de concursos e provas de habilitação.

A Aliança Nacional Libertadora (Estado Novo)

  • A frente antifascista

A ascensão dos totalitarismos de direita, quase por toda parte, motivou a formação de frentes antifascistas, com predomínio dos partidos comunistas em todos os países. Aliás, a Terceira Internacional (Komintern) - reunião dos partidos comunistas de todo o mundo - havia preconizado essa tática na luta antifascista: aglutinar todos aqueles que, por uma razão ou outra, eram contrários ao fascismo. O Partido Comunista do Brasil, fundado no início dos anos 20, adotou essa linha. A formação da frente antiintegralista resultou na Aliança Nacional Libertadora. Luís Carlos Prestes, que rompera com o tenentismo para converter-se ao marxismo, foi eleito presidente de honra da ANL, passando, assim, rapidamente à cúpula dirigente do PCB.

  • A "intentona" comunista

A ANL desde então cresceu vertiginosamente, despertando, em conseqüência, o receio das camadas dirigentes. O próprio presidente Getúlio Vargas, a fim de fortalecer o seu poder, serviu-se da ANL. Depois, através da intervenção policial, invadiu suas sedes e mandou prender seus líderes. Enfim, impediu a atuação da ANL na legalidade, forçando-a a passar para a clandestinidade.
Por causa da repressão da polícia, o PCB, movido pela ala radical, acabou optando pelo método insurrecional, dando origem à intentona comunista.
A rebelião eclodiu prematuramente (23/11/ 1935) em Natal, no Rio Grande do Norte, onde o batalhão em levante se uniu a populares, organizando o Comitê Popular Revolucionário. A repressão foi imediata, com o apoio da Polícia Militar e de fortes contingentes armados enviados pelos fazendeiros. Dois dias depois a insurreição foi esmagada.
No dia 25, em Recife e Olinda, guarnições militares sob domínio comunista se sublevaram e também foram reprimidas sem maiores dificuldades.
O mesmo aconteceu no Rio de janeiro no dia 27 de novembro. Destacaram-se na época, como representantes das forças repressoras, Eduardo Gomes (um dos sobreviventes dos 18 do Forte, 1922) e Eurico Gaspar Dutra.

  • A preparação do golpe

Para combater os levantes comunistas, Getúlio Vargas decretou o estado de sítio em novembro, que se prolongou até o ano seguinte. Era o pretexto de que necessitava para conduzir o país à ditadura. Era um pretexto, porque Vargas sabia de antemão dos planos insurrecionais do PCB através de elementos da polícia infiltrados no partido. E serviu-se do levante comunista - mal concebido, mal planejado e mal executado, sem a mínima chance de vitória - para atingir objetivos pessoais. Utilizando o argumento da "ameaça comunista", preparou, pacientemente, seu próprio caminho.
Quando se iniciou a campanha para a sucessão presidencial, a oligarquia paulista lançou o seu candidato, Armando de Sales Oliveira; os getulistas defendiam a candidatura de José Américo de Almeida. Porém, nem um nem outro estava nos planos de Getúlio, pois ele pretendia continuar no poder. E tinha fortes argumentos para isso; contava com o apoio do general Góis Monteiro, chefe do estado-maior do Exército, e do general Dutra, seu ministro da Guerra.

  • O “Plano Cohen” (1937)

Contudo, o Congresso Nacional, sentindo as manobras golpistas de Vargas, o impediu de renovar o estado de sítio. Para forçar a situação, Vargas simulou a farsa do Plano Cohen, de autoria duvidosa: tratava-se de um plano supostamente comunista, que visava ao assassinato de personalidades importantes, a fim de tomar o poder. Segundo a versão dos interessados na farsa, o documento fora "descoberto" e entregue a Góis Monteiro pelo capitão Olímpio Mourão Filho, membro integralista. O nome Plano Cohen foi dado por Góis Monteiro, responsável pela divulgação alarmista por toda a imprensa.
Diante da "ameaça vermelha", o governo pediu o estado de guerra, e o Congresso concedeu. Criaram-se assim as condições para o golpe. Getúlio buscou e conseguiu o apoio do governador de Minas, Benedito Valadares; no nordeste, a missão Negrão de Lima conseguiu a adesão de vários estados.
No dia 9 de novembro de 1937, Armando de Sales Oliveira apelou para as Forças Armadas, pedindo a manutenção da legalidade. Inutilmente, pois Francisco Campos, de tendência integralista e futuro ministro da justiça, já tinha sido encarregado de redigir a nova Constituição.
No dia seguinte, usando como pretexto a necessidade de se colocar fim às agitações, Vargas decretou o fechamento do Congresso e anunciou a nova Constituição. Em 2 de dezembro de 1937, os partidos foram dissolvidos. Era o início do Estado Novo.